sexta-feira, 31 de maio de 2013

Desconecte-se.

Lendo a última revista de bordo da Tam encontrei a reportagem de um artista que cria todo sua arte durante caminhadas. Caminhando, ele faz "grandes viagens", mesmo que sejam ali, na vizinhança. O que ele propõe é um novo olhar sobre aquilo que já conhecemos, com sentidos mais apurados e, desconectados. Segundo ele, "as pessoas estão constantemente em contato com o mundo e prontas para reportar tudo. Tiram fotos para olhar quando voltam para casa ou enviar aos amigos. O jeito que vivemos quebra os momentos." Há 11 anos fizemos um cartão multimídia para os clientes onde, justamente, falávamos que os grandes momentos da vida acontecem assim, num flash. Não dá tempo de ajeitar o cabelo nem de preparar o click. Eles simplesmente vêm e vão, instantaneamente. E ficam guardados na retina. Estou um pouco cansada do excesso de compartilhamento de momentos nas redes sociais. Adoro acompanhar a vida dos queridos, ver fotos de viagens, mas sinto que, muitas vezes, as pessoas não sabem mais como vivenciar experiências sem um iphone por perto. Aí eu recomeço aquele meu exercício "e se" e penso: e se a luz elétrica terminasse? Sem internet, sem tomadas para recarregarmos os celulares, em poucas horas tudo mudaria e, sim, acabaríamos nos reconectando com nós mesmos. Já pensou viajar de novo sem internet, resgatando velhos mapas, fazendo anotações em papel, sem que as pessoas pudessem nos ligar a qualquer hora? E sem culpa por não atendermos assim, on line. Conheço gente que tem tentado. Pessoas que optaram por não acessarem e-mail nos finais de semana e que, por isto, estão sendo massacradas. Parece que o Doutor Google está incorporado na nossa mente, como se não conseguíssemos mais pesquisar nada sem a ajuda dele. É automático, quase uma extensão dos nossos próprios dedos. Os exercícios que o artista propõe (o da revista da Tam) são bem simples. Têm a ver com inventar, percorrer percursos interessantes, improvisar. Com reconhecer o próprio bairro, sair com uns trocados no bolso, propondo-se a passar um dia todo a pé, leve e sem tecnologia. Grandes viagens ao nosso próprio mundo, com olhares curiosos, despidos de próteses artificiais. Quem de nós conseguiria passar um dia inteirinho assim?

Quer saber mais sobre o tal artista? O nome dele é Hamish Fulton, um "walking artist". 
www.hamish-fulton.com

quinta-feira, 30 de maio de 2013

As nossas crianças internas.

Fico cada vez mais impressionada com o poder de transformação das crianças. Dia destes minha filha foi para o escritório comigo e a senhora que ajuda a cuidá-la saiu para dar uma volta no corredor. Carolina, claro, conversou, deu gritinhos, interagiu com cada cantinho do ambiente. Eis que saiu de uma das portas um senhor sisudo, carrancudo, a própria imagem daqueles tios malvados das histórias de terror. Claro, estava incomodado com a intensidade do bebê que, em momento algum, chorou ou fez altos barulhos. Como ela reagiu àquela carranca toda? Deu um sorriso do tamanho do mundo para ele que, claro, se desmanchou. Sorriu de volta e até esboçou um pequeno aceno "fofinho". Saiu assim, leve, elevador abaixo, transtornado e, sim, transformado. Tenho a sensação de que crescemos em corpo, mas nossas crianças internas seguem ali dentro, latentes, doidas para se expressar. Os meninos e seus carros, os esportes radicais, o contato com animais, tudo isto ajuda a extravasar e nos reconecta com nossos serzinhos essenciais. Vejo isto quando organizo workshops. Empresários, engenheirões, homens de negócios viram crianças diante de folhas em branco, giz de cera, revistas para recortar, cola, espaço livre para desenhar. Nos aniversários infantis, aqueles cheios de lugares lúdicos, tirolesa, túneis, não raro pego os pais confessando a vontade doida de tirar o sapato e entrar nos brinquedos. Sufocamos nossas crianças internas e esquecemos que justo elas são a base da nossa criatividade e leveza. Praticar pequenas travessuras não só é saudável, como necessário. Com a Carolina, voltei a cantar, a dançar bem soltinha, a ler e contar histórias de um jeito exagerado e engraçado. Me pego botando a mão na comida, experimentando, me experimentando. Este feriado tão cinza tem tudo para ser uma grande folha em branco para que nossas crianças cresçam e apareçam dentro de nós. Se eu fosse você, tiraria o sapato e daria um alô pra sua.

terça-feira, 28 de maio de 2013

Fora da caixa.

Hoje eu desenhava com a minha equipe um evento para um cliente onde buscamos criar um ambiente bem solto para que designers "saiam da caixa". Não é pra ser nada fechado, corporativo, mas também não é um café solto e sem propósito. Começamos a esboçar como seria a condução do encontro e, em cada ensaio, lá estávamos nós caindo dentro da caixa de novo, tentando explicar demais e sentir de menos. Dia destes eu conversava com um cliente / amigo sobre nossa mania de compartimentarmos a vida. Como se fôssemos pedaços independentes que não conversam, dividimos nossos dias e nossas cabeças em partes. "Agora vou acionar o meu pedaço profissional". "Aqui termina minha jornada no trabalho e passo a ser mãe". "Desta vez, estou sendo a amiga do Fulano e, portanto, devo esquecer que ele é meu cliente". Eu sempre tentei exercitar o outro lado da história e, propositalmente, provocar as pessoas a se libertarem destes frames todos. Eis que, numa conversa bem franca hoje, percebi o quanto eu "tenho encaixotado" a minha vida. Por ser uma hábil malabarista, eu consigo migrar de uma "caixa" para outra, assim, num toque. Mas misturar as peças de uma caixa dentro da outra ou, melhor, tirar tudo dali de dentro e soltar no ar, ainda não tornou-se uma tarefa tão simples. Mais que isto, esquecer as caixas, até porque elas são fruto das nossas mentes lineares desenhadas para um mundo que não é real. Tenho bons ensaios acontecendo e, sim, me orgulho de cada um deles. Quando, por exemplo, eu apresento um ex-presidente de empresas para um jovem inquieto empreendedor de 20 anos ou quando eu provoco encontros de pessoas que "aparentemente não combinam" e sinto que dá um bom caldo, gosto muito. Mas sei que ainda tem muito pra ser construído - digo, desconstruído - e que o primeiro passo pode ser eu parar de inserir as pessoas num esteriótipo assim que eu as conheço. O João pode ser, sim, um ótimo intelectual. Mas tem tudo para tornar-se um bom cozinheiro e, quem sabe, surpreender a si mesmo pintando quadros. Serve para mim, que adoro me desafiar. Fazer mais daquilo que eu faço bem é fácil. E o que eu nunca experimentei, que jeito tem?

segunda-feira, 27 de maio de 2013

Janelas quebradas.

Eu tenho uma mania meio estranha de organizar o espaço imediatamente ao entrar em um banheiro público. Em aeroportos isto me dá ainda mais aflição. Parece que eu nunca entrei em algum que estivesse realmente "zerado". O mesmo acontece em restaurantes, botecos, museus. Na verdade, criei quase que uma teoria. Quanto mais "metido" o lugar, maior a tendência de o público "chutar o balde" e simplesmente não ter o menor cuidado com o espaço compartilhado. Tem a ver com as pessoas revelarem seu verdadeiro âmago em situações-limite. Vale no trânsito, quando aquela moça simpática e sorridente desce do salto, ou numa partida de futebol, quando o vizinho recatado do 63 grita na janela frases obscenas.  Num seminário que participei há um ano e pouco com grande pensador (público "cabeça" e super preocupado com o planeta, espaço de uma galeria de arte, zona nobre de São Paulo), o banheiro feminino estava um horror. Durante todo o curso. Por mais que as tias limpassem de tempos em tempos, as colegas, que minutos antes interagiam de forma amorosa, sequer davam-se ao trabalho de colocar o papel higiênico dentro do lixinho prateado. Vai ver que é justo porque sabem que "a tia" ia entrar e resolver tudo logo a seguir. Depois falam que os banheiros dos meninos é que são sujos. Não consigo sequer raciocinar quando eu entro e vejo  aquele monte de papel no chão, pia molhada. Me baixa imediatamente a Maria e saio ajeitando tudo. Em 30 segundos, dá pra dar uma boa geral e, assim, olhando de novo, respirar e ir realmente ao que interessa. O contexto é tudo, principalmente quando você está fora de casa. Tem a ver com cuidado, com uma busca de aconchego, de minimamente encontrar fora aspectos gostosos que buscamos e, espero, encontramos nas nossas casas. Custa um restaurante dito familiar colocar um trocador de bebê na parede do banheiro?
Há alguns anos, começou uma onde de preparar com muito cuidado os banheiros femininos durante festas, em casamento, geralmente. Mais que sabonete, pequenos cestos estrategicamente colocados passaram a abrigar fio dental, creminho, remédio pra dor de cabeça, lixa de unha, linha e agulha, lencinhos. Tudo tão simples e acolhedor! Aos poucos, alguns lugares incorporaram a ideia e a ampliaram, dando ao banheiro, até então coadjuvante, ares de protagonismo. Mesmo quem não precisa ir, acaba, seduzido pelos comentários alheios, dando uma voltinha para conferir a parede inusitada, o cheirinho, o jeito divertido que uma bicicleta tornou-se base para a pia. Nunca a teoria das janelas quebradas fez tanto sentido pra mim. O exagerar para entender usado na década de 90 em Nova York, pelo então prefeito Giuliani, e a repercussão positiva que teve, me faz ter ainda mais segurança de que são nos detalhes que moram as grandes mudanças. Quem não cuida do pequeno nunca terá energia para construir o grande.

domingo, 26 de maio de 2013

Assim, vazio.

Como boa representante do sexo feminino, tenho a incrível capacidade de fazer muitas coisas ao mesmo tempo. Escrevo caminhando, durmo pensando, dirijo planejando, faço mentalmente a lista do supermercado enquanto sigo firme em alguma posição bem cabeluda no yoga. Hoje encontrei uma amiga ainda mais hábil que eu nesta arte. Meus malabarismos ficaram com vergonha diante de tamanha competência. Executiva de mão cheia, organizou todos os mínimos detalhes da festa do filho de 3 anos. E ainda compareceu ao evento linda, magra e maquiada, cumprimentando a todos pelo nome, fazendo social nas mesas. Um fenômeno. Os homens não teriam tamanha desenvoltura. Mal conseguem digitar no computador e darem uma resposta - monosilábica que seja - a alguma inquietação que nós, mulheres, sempre temos nos horários bem criativos. Tendo a achar que eles são mais felizes. No mínimo, mais eficientes.
A minha síndrome de Mulher Maravilha ficou pra trás faz tempo. Deu lugar a uma Deinha bem mais escabelada e sem controle. No amor - ou na dor, fui abrindo mão e me abrindo para novas possibilidades, muitas vezes mais interessantes do que as que eu teria desenhado antes. Vale pra equipe, pra família, com a minha filha. Sabe que faz sentido? Fazer um milhão de coisas é o nosso "fácil". O desafio é não fazer, não mexer, não pensar, não desenhar e deixar, vez ou outra, o fluxo fluir. Esvaziar o copo, enfim. Não consigo fazer muito disto com meditação. Minha mente grita enquanto "medito". Mas fazer massagem ajuda. Arrumar o guarda-roupa também. A grande questão é dedicar algum tempo exclusivo para si. Para o nada, de preferência. Como o meu, agora. Como uma criança no meio de uma grande arte, estou sozinha em outra cidade, curtindo a travessura de dormir comigo mesma. Sem marido para eu chutar e puxar as cobertas e sem o bebê para me despertar (eu, no automático, com o peito a postos para dar de mamar)  terei logo mais à noite um feliz reencontro com a Andréa. Tava com saudades desta mocinha sorridente no espelho. Que nossos copos amanheçam mais vazios e renovados amanhã cedo. Boa noite :)

sábado, 25 de maio de 2013

Tramas da vida.

Quando eu era pequena, no interior do RS, aprendi uma série de atividades manuais. Sabia fazer tricô, crochê e cheguei a bordar toalhas em ponto cruz para um ensaio de casamento que não aconteceu quando eu tinha 20 e poucos anos. Fui criada bem "prendada", como se diz, com atividades ao ar livre e trabalhos manuais demais e televisão de menos. Parece ironia do destino, mas somente agora, morando em São Paulo, na correria da cidade grande, estou reencontrando as minhas raízes. Eu nunca tive a habilidade da minha irmã pra fazer tricô. Ela desenhava num papel um plano com o esboço das cores e formas que trabalharia a seguir e, assim, como por passe de mágica, as figuras iam se formando daquelas linhas tão soltas. O meu ponto sempre foi mais livre, mas ainda assim tinha um quê de terapia. Enquanto eu tricotava, pensava na vida. Os meus últimos meses têm sido realmente inspiradores, na medida em que vou tecendo ligações inesperadas com pessoas. Dou linha para as conexões, confio no meu sexto sentido e vou formando uma trama cheia de surpresas. E assim, tricotando, vou abrindo novas possibilidades para mim mesma. Uma delas vai acontecer muito em breve, agora em junho. Criei coragem e, inspirada nesta redescoberta das artes manuais, vou fazer uma oficina para amigos onde vou mesclar textos e tricô. Ninguém sabe direito do que se trata, mas o chamado já fez sentido para algumas amigas, que só de ouvirem falar no tema já se animaram e se prontificaram como participantes. Por acaso vai ser tricô. Poderia ser pintura, corte e costura, cozinha. O meio não importa. O que vale é a intenção. Ao resgatarmos o toque, ao religarmos a sensibilidade das nossas mãos em alguma atividade assim, lúdica, estamos nos reconectando com as nossas próprias essências, como crianças adormecidas que somos. Comer com as mãos, pintar com as mãos, sentir com as mãos - tudo isto faz bem. Pena que nos tiraram este pedaço. Bora resgatar?

quinta-feira, 23 de maio de 2013

ACV de mim.


“Diga-me com quem andas que eu te direi quem és.” A máxima que fez parte da minha infância faz bastante sentido na medida em que somos um pedaço dos muitos com os quais convivemos. As pessoas do passado, aquelas com quem eu interajo hoje e as que eu ainda vou conhecer têm muita responsabilidade sobre o “produto” que eu me torno a cada dia, enquanto ente mutante que sou. A “análise de ciclo de vida de produto - ACV”, tão usada nas indústrias nos dias de hoje, traz um pouco este propósito. Sugere que, num recorte do momento, como num exame de sangue, tenhamos detalhados todos os componentes que formam um produto, rastreando, da origem ao seu fim, processos, impactos etc. Com esta análise em mãos, as empresas têm a rara oportunidade de olhar para os dados e definir como aprimorar aquele recorte para, numa segunda oportunidade, construírem produtos e processos melhores, menos impactantes, mais interessantes, rentáveis, bonitos, enfim. Vale pra vida. Um exercício curioso, que pode ser colocado no papel. Lembrar dos meus amigos de infância, dos lugares onde eu estive, dos hábitos que eu cultivei, dos livros que li, do que eu comi, dos esportes que eu pratiquei, das músicas que me embalaram e, claro, do DNA que a minha família me emprestou, tudo isto, somado, me dá, hoje, um retrato da Andréa. Mas eu posso mudar muito disto. Tenho duas pernas para me mover, palavras para me expressar e vontade de promover mudanças, componentes de sobra para um grande laboratório de mim mesma. O retrato que terei em mãos daqui a algum tempo terá, claro, algumas pitadas de destino e do inesperado. Mas muito, muito mesmo, pode ser desenhado de um jeito diferente desde já. Tem a ver com fazer escolhas, com dizer não – e também com dizer sim, com se abrir para o novo, o diferente, com experimentar, experenciar, conhecer gente, se entregar. A essência, aquela que formamos nos primeiros anos, estará lá, intacta, brilhante. E, junto dela, novos “subprodutos” podem nos surpreender. Os pedaços soltos que formam a nossa história estão inteirinhos nas nossas mãos, prontos para serem lapidados e colados, num grande e curioso mosaico que é a nossa existência.

quarta-feira, 22 de maio de 2013

E se?

Dizem por aí que sou uma boa estrategista. Isto porque, antes de eu vivenciar uma situação, eu imagino tudo o que é possível de acontecer ligado a ela, nos seus extremos mais criativos para, no caso de alguma realmente acontecer, eu estar preparada. Tem a ver com as polaridades que se usam no Design Estratégico - e em outras tantas áreas, ou seja, imaginar situações extremas para tirar, dali, possibilidades de inovação e construção de coisas realmente novas. Na maior parte das vezes, nunca a situação extrema que acontece. Chega a ser divertido. Quando minha filha estava para nascer, pensei tanto em tudo o que poderia acontecer, desde o percurso até o hospital, as pessoas que poderiam me levar, caso o meu marido não pudesse. E se o carro estragasse. E se tivesse um trânsito terrível. E se não desse tempo... Claro que deu tempo. Carolina ainda escolheu a tranquilidade da cidade vazia num feriado para anunciar sua chegada. Menina esperta.

Mesmo que às vezes apresente algumas camadas de sofrimento, este tipo de exercício realmente aguça a imaginação e pode, ainda que trabalhando com hipóteses, apresentar possibilidades não antes imaginadas para as nossas vidas.

No fim do ano passado falou-se muito no tal fim do mundo. Mil teorias e a imaginação das pessoas a milhão, pensando em como seria, como fariam, como enfrentar tudo isto. No meio da história, surgiram figuras pitorescas que trouxeram pimentas sutis e provocaram, assim, como quem não quer nada, alguns destes exercícios de extremo. Um deles comentou, em conversas, a possibilidade dos bancos sumirem. Tudo poderia começar com um grande bug na internet. Sem conexão, não teríamos acesso aos bancos e, sem termos acesso a eles, não teríamos como provar quanto tínhamos aplicado (ou quanto devíamos – esta é a versão positiva da brincadeira). Sem os bancos e, dali a pouco, sem dinheiro vivo nas mãos, tudo seria diferente. Muito rápido, bem dinâmico. Imaginemos, então, somente para fins de exercícios, que isto realmente possa acontecer. O que você faria?

Tem um vídeo rolando na internet há tempos de um professor que estimula os alunos a pensarem em suas verdadeiras vocações isolando a variável dinheiro da história. Digamos que o dinheiro não importasse, que suas contas estivessem pagas, o que você faria assim, genuinamente?
Eu fico imaginando a cena. Meio inspirada no filme “Ensaio sobre a cegueira”. Os homens, no seu limite, nada de dinheiro circulando e, aos poucos, as pessoas se rearticulando, como numa grande volta ao tempo das cavernas. Só que em cavernas de concreto, nas nossas cidades. Sem dinheiro para comprar nada, não teríamos tampouco gasolina para os carros e teríamos que, em pouco tempo, nos reorganizarmos em grupos, que somos, para cada um entregar o que tem de melhor. O estatístico, este cuidaria de calcular as provisões e de como utilizá-las. O articulador trataria de sair conversando com os vizinhos, em busca de permutas. E assim, sem televisão, sem internet e, justo por isto, com tempo de sobra, relembraríamos quem somos. Alguém puxaria uma roda de violão, contadores de histórias brotariam cheios de verbos e, certamente, as crianças dariam uma aula de colaboração. O exercício vale para as empresas. E se as contas estivessem pagas? Se os fornecedores que escolhêssemos nos entregassem a matéria-prima que quiséssemos, sem que tivéssemos que pagar. Se os clientes não se importassem com o preço e pudéssemos escolher, de fato, para quem gostaríamos de produzir um produto. Ou oferecer um serviço. Seriam os mesmos? Como ficaria a nossa energia da escolha, da entrega, do processo todo? Iríamos trabalhar? Ou nada mais faria sentido?
Eu não acho algo deste tipo vá acontecer. Pelo menos não, assim. Não amanhã. Mas me divirto de verdade observando meus amigos, os vizinhos, os atores corporativos, os rostos desconhecidos no supermercado e imaginando quais seriam seus novos papeis dentro de jogos divertidos de desconstrução.
E se?


* segue o link do tal vídeo que comentei, usado por um professor com seus alunos: http://www.youtube.com./watch?v=qmaq15qL7Q8

terça-feira, 21 de maio de 2013

Laços fracos.

Esta história também veio do papo da semana passada, por acaso também com o Oswaldo, um amigo querido, citado dois post atrás. Aprendi mais um conceito, que fez todo sentido pra mim. Falávamos sobre inovação e do quanto é difícil fazer algo realmente novo. Eis que surgiu o papo sobre "laços fortes" e "laços fortes". Eu explico. Segundo consta, os laços fortes são aqueles já estabelecidos com as pessoas que fazem parte da nossa vida. Entram aí família, amigos mais chegados, as pessoas do nosso trabalho, algum vizinho, enfim, aquelas criaturas com as quais estamos acostumadas a nos relacionar e, justo por isto, faz bastante sentido que tiremos "mais do mesmo" em cada interação. Nada de errado nisto. Pelo contrário, são nossos portos seguros. E, quando conseguimos algo diferente delas, puxa, melhor ainda. E os laços fracos são aqueles que estabelecemos com pessoas que aparecem nas nossas vidas meio por acaso, numa situação inesperada. Muitas delas, surgem uma vez e somem, deixando um pedaço de si com a gente. Sabe quando você fez aquela viagem a outro país e conheceu num bar alguém com quem conversou sobre a vida e que provocou você a pensar sobre algo de um jeito que você nunca tinha imaginado? Ou aquela criatura que te falou sobre um livro, livro este que, tempos depois, fez você começar um novo projeto? Pois, segundo o nosso papo, são os laços fracos que nos ajudam a inovar. Como não temos grandes compromissos e também não estabelecemos uma rotina com eles, acabamos sendo tocados de jeitos inusitados por estas relações que, muitas vezes, são o pulo do gato das nossas histórias pessoais. Hoje em dia, com as redes sociais, os laços fracos ganham até um quê de laços mais fortalecidos, na medida em que temos a oportunidade de "espiar" o que estas pessoas têm feito, o que pensam, como enxergam o mundo, sem que necessariamente continuemos a conviver com elas. Dito isto e pressupondo que faz sentido, abrir a cabeça e a agenda para conhecer gente nova faz ainda mais sentido. Muito, aliás. Nas nossas vidas profissionais, quantas vezes nos quebrando buscando uma solução nova e convidamos para a "conversa" as mesmas pessoas de sempre? E quando temos um problema pessoal e, do nada, numa roda informal, algum amigo do amigo aponta um novo olhar sobre o tema daqueles que muda tudo assim, meio instantâneo? Sim, fortalecer os laços com os nossos faz muito sentido. Traz conforto, nos ajuda a lembrarmos quem somos e a que viemos. Mas deixar o inesperado atuar vez ou outra, julgando menos e absorvendo mais, tem tudo pra ser também bacana.

* By the way, algumas vezes os laços fracos viram fortes. Em alguns dos casos, bem fortes. Dou o maior apoio. Eu mesma conheci um com uma proposta tão inovadora que acabei casando :)

segunda-feira, 20 de maio de 2013

Aquelas vozes internas.


Semana passada eu conheci uma menina com nome de flor. Falamos sobre a vida, sobre as nossas inquietudes e sobre nossas vontades de voltarmos a exercitar lados que ficaram adormecidos. Eu super me empolguei quando ela comentou que participou de algumas dinâmicas de conversas com tricô na roda. Enquanto se tricota (e aí desvia-se o cérebro, abrindo um lado criativo e despretencioso), flui a conversa e surgem conceitos e novas ideias. Pode ser tricô, origami, desenho, pintura de mandalas. Cada um usa um jeito. Todos válidos e igualmente lúdicos. Daí surgiu uma fala dela da vontade de voltar a escrever. Segundo ela, o dom da escrita era algo bem apurado na infância, até que um dia ela mostrou um texto para a avó que, muito rígida, disse que estava péssimo. O que aconteceu? Hoje, 20 anos depois, sua auto-crítica ainda não permitiu que tenha voltado a escrever. Aquela voz interna da avó somada ao olhar de repressão simplesmente castrou naquela menina, agora mulher, toda e qualquer coragem de colocar no papel suas experiências. Quantas vezes não fizemos isto com nossos filhos, amigos, com nossa equipe? Eu mesma, com meu jeito brincalhão de falar, já disse para a filha de uma amiga que o desenho dela estava "feio". Claro, ela não entendeu como ironia e não achou nada divertido. Um desastre! Então tá, como não matar as nossas crianças internas e, ainda assim, trabalharmos em cada uma delas seu senso crítico, em busca de uma qualidade genuína, que sempre pode ser melhorada? Uma pista: tem a ver com o jeito de falar, desconfio. E, claro, com o queridíssimo paradigma do cuidado, do Bernardo Toro. Cuidar não custa nada. E vale muito. Assim, fantasmas com potencial de nos atormentarem por toda a vida podem virar amigos imaginários nos ajudando a exercitar o que temos de melhor, livres e entregues às nossas verdadeiras vocações. Quem topa começar?

domingo, 19 de maio de 2013

Foi num 28 de setembro.


Era um dia bem ensolarado, daqueles típicos de começo de primavera. Friozinho. Numa casa neo até no nome, recém inaugurada, 44 corajosos reuniram-se, baseados simplesmente na confiança e na intuição. Eu, barriguda que só de uma Carolina que chegou pouco mais de um mês depois, fui uma das provocadoras / anfitriãs, curiosa deste encontro que, para mim, foi só a faísca de muitos outros que virão. Já estão vindo! Ninguém sabia o que era, por que era nem quem estaria lá. Mas todos confiaram e foram. Alguns meses se passaram e o que conversamos num grande círculo no dia 28 de setembro de 2012 nunca esteve tão atual. Somos, afinal, seres inquietos, “almas inquietas”, como nos chamamos depois. Este encontro aconteceu de fato. E continua retumbando na minha cabeça. Não acho justo não divulgar o que falamos por lá porque, de uma forma ou outra, cada um de nós foi um pouco espelho do momento que vivemos hoje na tal Humanidade. Aqui vai o relato que fiz uns dias depois. Assim, meio solto, meio de sopetão, ainda engasgado e sendo digerido. Cada frase daria um post e uma semana de reflexão. Sigo desaprendendo com tudo o que aprendemos por lá.

By the way, o que inquieta as nossas almas?
No último dia 28 pudemos falar sobre isto num grande círculo aberto de sentimentos e percepções. Éramos 44, mas representávamos bem mais que este número, até porque nós mesmos estávamos lá carregando diferentes papeis e personagens. De gestores e profissionais, felizmente, levamos poucos e conseguimos deixar relativamente do lado de fora as preocupações corporativas para levarmos um tanto de nossas outras personalidades. E era uma sexta-feira de fechamento de mês e trimestre! Ninguém chegou lá com seus cargos ou sobrenomes. Éramos nós mesmos, em primeiro nome, todos inquietos, curiosos e corajosos para nos entregarmos a algo que nenhum sabia o que seria.
Aos poucos, o círculo fluiu e os pontos de conexão começaram a se estabelecer, num discurso individual que tinha muito de coletivo. Cada fala poderia ser minha. Na verdade, era um pouco de cada um retratado na boca do outro. Ufa. O convite tinha sentido e as pessoas, tão diferentes, estavam ali todas muito iguais.
Levamos objetos e fotos que nos representam e despimos nossas almas para mentes desconhecidas.

Falamos de nossos medos, desejos, sonhos, inquietudes. Das redes digitais X livros físicos, dos nossos filhos, nossos hobbies, do que fazemos para aquietar nossas cabeças. Contamos que largamos nossos empregos para buscar sonhos, que sentimos falta de um propósito, que nos sentimos incompletos e que queremos exercer nos nossos dia a dia quem nós somos de fato. Descobrimos, juntos, que não fazemos nada sozinhos, que unir pontas e juntar coisas faz cada vez mais sentido. Queremos desaprender juntos e nos alfabetizar novamente. Desta vez, alfabetizar os nossos emocionais.

Respondemos ao chamado, à palavra “venha” e, quando vimos, estávamos ali, entregues, nos enxergando como seres desta casa-planeta tão ampla. Somos parte deste todo. Compartilhamos a necessidade de enxergarmos além do que vimos, a importância de usarmos novos olhares para abrirmos nossos campos de visão. E que talvez nossos filhos sejam grandes pontes para nos ajudarem nesta amplitude visual. Sempre vai ter um espaço que não compartilhamos. É neste gap que entra a confiança para enxergar o que eu não estou vendo.

Chegamos por causa de uma sequência de eventos, que começaram no dia em que nascemos. Somos o que construímos. Vimos, independente das idades e das tais “questões geracionais”, pessoas lidando com um novo social. Não precisamos de organizações hierárquicas para nos relacionarmos. Este tal “livre arbítrio” nos inquieta. Afinal, o que cada um vai colocar nesta malha abundante para deixá-la fluir?

Trouxemos histórias em comum de pessoas empreendedoras e corajosas. Muitos de nós trouxemos histórias de família de também empreendedores que nos inspiraram. Éramos muitos engenheiros, todos abertos a reengenharias de vida, sobretudo, engenheiros de gente, questionando coisas da vida, modelos de produção em consumo, com a certeza de que uma mudança é possível. A mudança ainda não aconteceu porque as pessoas não querem. Falta a transformação pessoal.

Enxergamos nos nossos filhos suas capacidades de viverem o agora, de não terem limites nem medos. Por que nós não nos permitimos viver o agora? Temos que esperar as aposentadorias para nos prepararmos para usufruirmos de uma “tal liberdade”?

Esta coisa de nação, local, regionalismos, isto tudo já era. Foi. Não estamos falando de reforma, mas de uma grande revolução. Precisamos de gente jovem disposta realmente a mudar, tenha ela 15, 40 ou 70 anos. Juventude de sangue e coragem para mexer. Nós ainda não acreditamos uns nos outros, não nos entregamos, “vamos dar com a cara no poste e continuamos andando a passos firmes”. Digamos não aos esteriótipos, não adianta mais discutirmos a superfície! Temos que ir no âmago.

E aí vem a pergunta: qual é o legado disto tudo que eu estou fazendo? Como apresentar projetos que não sabemos como fazer e como encontrar pessoas que topem saber que não sabemos? Não sabemos o que fazer mas estamos dispostos a fazer. E este tal processo colaborativo pode ser bacana. Com que pessoas, afinal, eu quero trabalhar? Com quem quero customizar a minha “vaca em branco”? Tem a ver com educação, reeducação, “deseducação”. Precisamos procurar as pessoas certas para dar sentido a tudo isto. Precisamos sair do efeito “manada” e deixarmos de ser mais uma vaca no rebanho. Estamos abrindo mão de sermos humanos!

Como, então, modificar esta realidade? Como nos comunicarmos / interagirmos diferentes dos animais? Onde fica nosso poder de indivíduo na sociedade? Estamos realmente buscando romper para sairmos do rebanho, buscando outras questões? Como construirmos uma linguagem comum às nossas inquietações? Como sermos elásticos para mudar, sem perdermos nossa capacidade de amarrar as coisas de vez em quando?

Já percebemos o poder das comunidades. Pequenas cidades podem fazer milagres. Precisamos tomar o poder de volta e agir, fazermos uma viagem ao interior para encontrarmos mais sentidos para nossas vidas. O que queremos é tão simples quanto amar e sermos amados, sermos reconhecidos. Por que, então, é tão difícil? Buscamos a auto-suficiência, queremos criar nossos mundos, com energias renováveis e renovadas. O alimento nos ajuda, as histórias de vida de nossos avós, a consciência do local dentro do global, a comida que também alimenta a alma. Queremos criar cidadania, dignidade, curiosidade, propósito, com pessoas jovens de espírito ou com espírito jovem. Queremos transformar, queremos encontros de troca e experiências, queremos viajar para um mundo melhor, inovar, renovar.

Somos um pouco físicos, curiosos, vivemos num mundo de incertezas, da interdisciplina, da rede. Não temos que salvar o planeta. Temos é que nos salvar enquanto pessoas que somos. Fazemos as mesmas coisas há tempos e esquecemos de renovar as nossas energias pessoais. Onde isto vai parar? Fazemos força demais para as coisas erradas. Não basta sermos esforçados. Temos que direcionar esta força toda para o lado certo. Preciso de um outro sistema onde eu me apoio, de pessoas que queiram transformar o mundo tocando no mundo atual.

Temos muitas coisas importantes ainda por fazer. E temos todos, como pessoas, condições de darmos mais. A força agora é no cidadão, no poder de fazer a transformação. Fazer um churrasco, reunir a família, os amigos, isto nos renova, reconecta, desperta os sentidos.

Nossas fraquezas, tão escondidas, são, afinal, bem-vindas. O que eu precisava era só aprender a pedir ajuda. Não consigo fazer nada sozinho. Nos reunimos neste dia 28 para pedirmos ajuda para construirmos os nossos caminhos. “Quanto mais eu consigo me entregar e pedir ajuda, mais forte eu fico.”

Se não pararmos de dar corda às nossas almas inquietas, nossos bichinhos vão continuar pulando e girando sem rumo e seguiremos como pessoas desconectadas. Quem tem coragem de dar um fim a isto, de admitir fraquezas, de resgatar as palavras e as pessoas? Viemos aqui por conta das palavras. Escrever ajuda.Voltemos ao mundo das palavras para reaprendermos a viver com alguma serenidade.

Se olharmos lá fora – e também aqui dentro – as pessoas que puderam fazer um balanço de suas vidas se arrependeram de coisas bem simples. Como de terem tido pouco tempo para a família, para as coisas coloquiais, banais, triviais, simples. Vivemos com culpa por não estarmos inteiros com os filhos, os amigos. E daí vem o dilema: geramos valor para os acionista ou jogamos bola com a gurizada? Os lugares onde conseguimos nos reconectar não têm nada de luxo. São triviais. Nos reencontramos correndo, no silêncio do mar à espera de uma onda, cozinhando, rabiscando. Temos instintos bem básicos que procuramos contemplar toda hora e esquecemos de um bem importante: o gregário! Precisamos viver em bandos! Precisamos nos encontrar com as pessoas e queremos que estejam o mais inteiras possíveis em cada um destes encontros, com menos avatares e mais alma. Somos produtos à venda nas redes sociais, observados, expostos. Onde fica nossa abordagem mais crítica do consumo para que não viremos, novamente, manadas?

Alguns de nós meditam há anos. Outros têm a vontade, mas ainda não a coragem. Nos inquietamos com as doenças da sociedade, com o piloto automático que vivemos, com a corrupção escrachada, com a impunidade. Que filhos vamos deixar para o mundo? Será que nos demos conta que o tal modelo capitalista também fracassou? Preparar para o vestibular desde a primeira série não serve! Quem nos prepara para a vida? Estamos cuidando de periféricos e esquecemos de nossos pontos centrais! Viramos escravos de um modelo muito bem montado. E este consumismo exacerbado incomoda. É comum, mas não é normal!

Estivemos reunidos porque tivemos a coragem e a capacidade de estarmos juntos sem piloto automático, de fazermos, pelo menos um dia, meio sem mapa. Nos encontrarmos trouxe um pouco de conforto, deu alguma referência, ainda que móvel, aos nossos mares pessoais. Trouxemos fluidez e entendimento às nossas questões, nos sentimos “meio sócios” em propósitos, nos reconhecendo uns nos outros como seres humanos capazes de confiar, de admirar e ter afinidades. O futuro da competição tem a ver com unir e co-criar, com o valor da troca, com arte, sabedoria e conhecimento. A arte nos faz mais humanos, mais sensíveis. Vamos resgatá-la em nossas vidas!

Fomos para a vida feito passarinhos e estamos reaprendendo a voar. Nos encantamos com as relações, com a profunda transformação do mundo, que já começou. Nossas vidas têm sido um grande voo, um bater de asas, uma desconstrução, uma reassociação. Chegamos cheios de incertezas porque, no fundo, gostamos delas. Cada vez que fizemos uma viagem, estamos mergulhando num universo de incertezas. Estarmos mais conscientes sobre as incertezas ajuda. Buscamos em nós mesmos, nos nossos nomes “oficiais”, ou nos nossos apelidos, espaços para sermos inquietos e também felizes. Nos adaptamos, corremos, buscamos nossos tigres de pelúcia para reaprendermos a magia de brincar. O tempo passou rápido e nossas crianças ficaram pelo caminho. Nossos oráculos do pão estão aí, disponíveis para nos ajudarem a re-despertar e a nos redescubrirmos.

Quem de nós já chegou do outro lado, já tem tempo pra família, já vive no mato, também está em crise. Bela ironia do destino! Reconstruir laços também faz parte. Não dá pra ser feliz sozinho. Há uma força divina na co-criação, nesta coisa que nos une pela respiração. Somos privilegiados, até por nos permitirmos parar e questionar. São as diferenças que nos fortalecem como grupo, para que não nos tornemos pequenas igrejas. Resgatemos nossas inocências, reaprendamos a sintetizar. As lições todas já foram ensinadas. E os pontos de contato vão aparecendo nas falas, à medida em que interagimos, que trocamos.

Temos, juntos, a capacidade de gerar ação, de fazermos uma transformação profunda. Vamos passar a viver muito mais tempo. O que fazer com isto tudo? Somos indivíduos altamente conectados, protagonistas em nossos locais. Temos que reaprender a tirar o sorriso dos outros, a desarmá-los, nem que tenhamos que vestir uma máscara de “lobo mau do bem”. É simples como isto. Porque acessamos o lado infantil do outro, o desarmamos quando o fizemos. Não é doutrinar. É pensar em experiências positivas, em pequenos grandes movimentos que nos ajudem a aprendermos a envelhecer e a viver. Estamos falando em amizade, em intelecto, em buscas espirituais, pessoais, em nos reconhecermos como veículos de passar coisas que conhecemos ou descobrimos. Pedir ajuda, dar as mãos, afinar relações podem ser bons caminhos. E não adiantar só pensar, desenhar. Temos também que agir, levar para um lugar melhor algo do que aquele que você pegou. Nossas funções são fazer alguma coisa, criar, concretizar também.

Para isto, precisamos, de tempos em tempos, respirar o vazio e o silêncio. Esquecer um pouco a aflição de estarmos aflitos e encontrarmos serenidade e paz para nossas inquietudes. Façamos o que está ao alcance de nossas mãos. E já está de bom tamanho.
Nos reencontramos, no grupo, com conexões antigas e inesperadas. Com pessoas que não víamos há tempos. E com outras tantas que nunca vimos e que disseram muito de nós. Nos descobrimos inquietos porque nos enxergamos como grandes árvores de natal, cheios de coisas penduradas. Temos que desconstruir! Encontrar a essência. E isto vale ainda mais para aqueles que começaram já a jogar “o segundo tempo” da vida.

Nos dedicarmos àquilo que realmente importa, à essência, a fazer menos e melhor.
Reencontramos nossos perfis exploradores, grandes guerreiros, amantes e descobridores da impermanência da vida. Nos inquietamos com reuniões demais e ações de menos. Tem que ter fricção para fluir. Mais que guerreiros, que todos somos – e dos bons, chegou a hora de “largarmos um pouco as velhas armas” e nos redescobrirmos como cuidadores. Primeiro, de nós, para então aprendermos a cuidar do entorno e, quem sabe, do planeta. Se eu ainda não sei nem cuidar de mim, como vou cuidar do outro? A vida cuida da vida. Vivo dos instantes e do momento. E como dizem os “novos filófosos”, “quando a mente fica quieta é tão bom porque depois ela se enche de ideias”.

* E se eu fosse escolher uma só palavra pra tudo isto? Desaprender! Simples assim. Mas quem disse que é simples?

sábado, 18 de maio de 2013

As chaves do Oswaldo.


Eu fiquei quebrando a cabeça para saber qual deveria ser o primeiro post do resto desta nova jornada, um ano depois. Ano sabático do blog, coisa forte, nada a ser dito. E tudo o que eu imaginava como um bom recomeço parecia não ser relevante o suficiente para a tal “volta”. Daí eu vi que se continuasse assim, nada seria escrito. E resolvi começar a escrever nos últimos dias as coisas que me intrigavam justo neste período. As outras todas, de um ano atrás até aqui, ficaram meio que pra trás. Fazer o que. Impermanência, desapego, enfim.
Pois bem, uma das coisas que tem me intrigado nos últimos tempos são as chaves do Oswaldo. O Oswaldo é um cara bacana que apareceu na minha vida no ano passado e, assim, acabou ficando. Sorridente, inteligente, generoso, provocador, é o “cara das redes” e prega, na teoria e na prática, um mundo compartilhado, mais dividido, menos linear, digamos. Ok, “prega” é um verbo meio forte, até porque ele não tenta convencer ninguém a nada. Simplesmente chega e compartilha o que vê, experimenta.
Este papo todo de um mundo mais co-criado, onde os papeis se auto-regulam (como na natureza) e tudo flui parece conversa pra boi dormir, como dizem na minha terra. Mas, não. E há teorias e algumas boas práticas sobre isto, felizmente.
Justo para “experimentar” esta coisa toda, recentemente o Oswaldo criou uma história muito bacana. Dividiu em pedaços uma casa super astral, na Vila Madalena (bairro charmoso aqui de SP) para que diferentes pessoas pudessem se instalar por lá e, dependendo do número que demonstrasse interesse, dividissem por igual as despesas do espaço. Mais ainda, estas mesmas pessoas, que já começaram a surgir – e que toparam a ideia – têm a missão de se auto-regularem por lá, organizando a agenda do espaço e decidindo, juntas, o que tem a ver com a casa que tipo de atividades pode acontecer, quando, como e com quem. Não tem um dono. Tem um grupo de criaturas ousadas que toparam fazer daquele espaço um espaço seu – e também “nosso”. A coisa já começou. Claro, com um empurrão do Oswaldo, mas começou. Para simbolizar tudo isto, ele, o Oswaldo, tirou muitas cópias das chaves e as distribuiu para estas pessoas que, a partir de então, são co-responsáveis pelo espaço. Tão simbólico quanto a entrega das chaves da cidade para pessoas importantes da sociedade. Alguém lembra? E não para por aí. As mesmas chaves daqui de São Paulo serão entregues às pessoas de uma casa com este mesmo espírito que já existe em Porto Alegre, numa rua, vejam só, chamada Liberdade. No meio disto tudo, têm surgido situações pitorescas e muito animadoras. Em algumas das “entregas das chaves”, o Oswaldo recebeu, em troca, as suas chaves de casa da pessoa. Teve até quem quis entregar a ele as chaves do carro, num gesto amoroso de “entendi o seu recado, amigo.”
Quantas vezes nós não temos ideias assim, tão doidas e maravilhosas? Quantas vezes não imaginamos espaços abertos com pessoas que fazem sentido, a construção de novos mundos dentro dos nossos mundos possíveis. E quantas foram as vezes que nós mesmos desistimos, por vergonha, medo, por não sabermos, enfim, como começar? Pois bem, graças a alguns corajosos malucos, vejo pipocar por aí iniciativas impressionantemente simples e deliciosamente transformadoras. Abrir mão do nosso senso crítico castrador, vez ou outra, tem tudo para revelar muita coisa linda logo ali, do outro lado da porta.  

Voltei :)


Hoje faz um ano e cinco dias que eu não escrevo no blog. O mundo rosa ficou adormecido enquanto uma nova Andréa despertava. A mãe da Carolina chegou neste meio do caminho com tudo. Intensa, curiosa, ainda mais questionadora e, sim, muito feliz. Tenho me redescoberto a cada dia e ainda não sei aonde esta brincadeira toda vai parar. Só sei que, apesar de tudo ser tão novo – talvez justamente por isto – me agrada muito. Neste período, promovi encontros, conheci mais gente, tomei mais cafés (ou chás, ou sucos) e estou ainda mais segura de que são as relações entre as pessoas que nos renovam. Ficar sozinha num cantinho é bem fácil. Vai dividir, questionar, encontrar espelhos por aí. O bicho pega. Que bom. Pois bem, graças ao convite da Ana Goelzer, uma querida que sorri com os olhos, estarei no Tedex Laçador em junho, em Porto Alegre. E graças a tudo isto, resolvi colocar no meu “curriculo” o blog, como uma forma de provocar a mim mesma para resgatá-lo. Tava na hora. Precisamente na hora. Só as conversas que eu tive com algumas destas pessoas que mexem com a vida da gente nos últimos dias já dariam pano pra manga pra uns 20 posts. Então tá. Assim, aos poucos, sem muito filtro (para eu mesma não me barrar), devo voltar a falar de mim e do que eu tenho visto por aí. O tom rosa está ainda mais intenso, mas há várias várias outras cores, igualmente fortes, que têm dado à minha existência ares bem interessantes. Devo compartilhá-los novamente por aqui. Comigo mesma (sempre me surpreendo ao reler os textos uns dias depois) e, quem sabe, com alguém como você, que me lê agora e que, de alguma forma, me anima para continuar nesta jornada.

* a menininha sorridente da foto é, sim, a Carolina, minha filha maravilhosa e responsável por muitas das mudanças na minha vida nestes últimos meses. Mas não por todas, felizmente :)