quinta-feira, 5 de maio de 2011

Óculos coloridos da deinha

Ontem à noite eu tive mais um encontro das Gestadoras do Futuro, um grupo de mulheres (e homens) que dedicam tempo e energia em busca do resgate do poder feminino, no seu sentido mais autêntico (e, por favor, nada óbvio). O que se busca nestes encontros é uma forma de suavizar as nossas relações, pessoais e profissionais, através do resgate de valores sutis e amorosos. Parece uma viagem. E é. Por isto mesmo é tão interessante. Mais do que buscar alcançar este objetivo, o grupo me dá a rara e valiosa oportunidade de interagir com pessoas fantásticas, com experiências de vida bem diversas e muita vontade de trocar. Falávamos, entre um chá e outro, sobre o nosso olhar sobre o mundo. E no quanto ele pode estar "viciado" em lentes artificiais. Desde que eu voltei do Butão as pessoas me perguntam o que eu vi, senti e, de forma velada, o que eu achei de tudo aquilo. Estou angustiada porque eu ainda não achei nada. Eu só vi e ouvi muita coisa por lá. E ainda não consegui ouvir a mim mesma. Tenho um medo enorme de jogar nas palavras impressões preconceituosas sobre um país cuja cultura difere da nossa em praticamente todos os aspectos. Quem sou eu para julgá-los ou para dizer se estão certos ou errados? Uma das pessoas do grupo de ontem trouxe a história de um monge tibetano que veio morar na Argentina. Sim, ele saiu do Tibet a convite de algum argentino (eles só podem sair com convites formais do país que o convida) e veio viver sua vida na América do Sul, dividindo sua vida com "los hermanos". Quando questionado sobre o motivo que o fez mudar radicalmente, ele contou que veio para ver como vivem "os pobres do mundo". Sim, na visão dele, com a lente dele, nós somos seres diferentes e estranhos, pobres (talvez dignos de compaixão) e, principalmente, muito bravos. Digo "somos" porque nossos comportamentos ocidentais de sulamericanos são bem parecidos, em linhas gerais (no trânsito, no trato com o outro). Ele não consegue compreender por que os argentinos gritam e exaltam-se tanto por qualquer coisa. Como nós não compreendemos os casamentos arranjados da India ou as práticas e rituais de países com o Butão. Talvez não tenhamos sequer que tentar entender. Somente respeitar. A Regina, uma destas pessoas que não vive neste planeta (um anjo talvez) trouxe ao debate um conceito bem legal. Ela falou em não usar a expressão "direitos humanos", porque ela já carrega um tom de "certoX errado". Mas se falarmos em valores humanos, eles são universais. E, por isto, não se pode admitir nenhuma violência, em nome de uma religião, de uma cultura ou do que for. Simples. Não, felizmente eu não vi nenhuma violência deste tipo no Butão.  Pelo contrário. Então tá. Resumindo e entregando um pouco do que eu já consegui digerir até agora: os butaneses são felizes de verdade, sim. Com seus óculos coloridos por bandeiras e crenças, com seus estilos de vida e com uma boa dose de budismo pra acalmar a mente, fica mais fácil atingir altos indicadores do FIB (Felicidade Interna Bruta). Eles não têm o nosso chip para o consumo (por quanto tempo?) e têm uma paz de espírito bem escassa por estas bandas de cá. Se eu viveria lá e me consideraria feliz por isto? Acho que não. Nem por isto eles são melhores ou piores que nós. São diferentes e, por isto, tão ricos e curiosos. Se eu vou conseguir aplicar o tal FIB na minha vida pessoal, nos meus clientes, em algum lugar? Também não sei.  Independente da aplicabilidade prática do indicador, ele mexeu comigo porque me levou para o outro lado do mundo, colocou novos ares na minha vidinha e abriu minha agenda para duas semanas de paz comigo. Com ou sem o óculos rosa, a Deinha voltou do Butão diferente. Mais leve, inquieta, verde de tanto tomar chá, cheia de cores e experiências nas bagagem. Eu ainda não a desvendei, mas gosto dela mesmo assim. Assim, escabelada, desnorteada e com um sorrisão gigante entregue nas fotos.

segunda-feira, 2 de maio de 2011

Impermanência

Como eu já disse anteriormente, sou uma simpatizante do budismo. E agora, na minha volta da India, ainda mais do hinduismo. Também entendo que o espiritismo faz muito sentido e respeito quem é católico, praticante ou não. Eu voltei da India / Butão há pouco mais de uma semana. Minhas ideias e meu fuso (con-fuso horário) começam a se organizar agora. É que na minha volta a minha rotina não teve nada de normal. Casa nova, muitas caixas espalhadas, marido, preparativos para a festa do casamento, muuuitas mudanças. Não sei como teria sido se eu tivesse voltado dentro de "condições normais de temperatura e pressão". Mas a minha nova realidade está bem  divertida e completamente "fora da rotina". Aí eu me lembrei de um ensinamento budista bem bacana, que fala da impermanência. A grosso modo (como eu disse, sou simpatizante ainda e, portanto, leiga), ele fala que nada na vida é certo. E que nos apegarmos a qualquer coisa (pessoas, objetos, acontecimentos) é uma pena porque elas, cedo ou tarde, passarão. Parece meio duro, meio frio. Mas faz muito sentido. Você já parou pra pensar como era e no que você acreditava 20 anos atrás? E no quanto suas ideias, desejos e visões de mundo se transformaram? Pois é. Não sei quanto a você, mas pra mim, tudo mudou muito. E espero que continue mudando, de preferência pra melhor. Quando eu estava no Butão, diante de algumas paisagens simplesmente deslumbrantes, imensas e serenas, eu tive o cuidado de me concentrar algumas tantas vezes pra viver aquele momento. Respirava e tentava ter a máxima consciência possível do que eu estava vivendo. Eu sabia que dali a alguns minutos, tudo seria passado. Assim é nossa vida. Mudamos o tempo todo. Mesmo sem querer. Acontece. Faz parte. Eu sou apegada às pessoas. Gosto delas, gosto de interagir, de saber como elas estão. Mas estou tentando me desprender um pouco desta coisa da "posse" que fomos ensinados a exercitar para deixá-las bem livres e seguras de si. Se elas mudam o tempo todo (e mudam), temos que mudar também. E reconquistá-las, surpreendê-las, reaprendermos a lidar com elas. Isto vale para objetos, claro, para desafios, para o que eu conquistei. Estou tentando escrever sobre a viagem, sobre as minhas anotações e os pensamentos que surgiram nestes quase 20 dias de experiências inusitadas. Quanto mais eu penso, menos sai. Muita informação. Muita coisa pra pouco tempo de vida real. Aí me surgiu a vontade de falar sobre isto. Sobre a impermanência das nossas vidas. E sobre o quão libertador é aceitarmos este fato e conseguimos lidar com ele em paz. Simples assim. Mas quem disse que é simples?

* este menininho butanês fez meu tempo parar quando eu o vi. Lindinho, simpático e super interativo, ele me fez lembrar do meu mundinho rosa quando eu tinha a idade dele. Passou, mas continua vivo dentro de mim.