quarta-feira, 22 de maio de 2013

E se?

Dizem por aí que sou uma boa estrategista. Isto porque, antes de eu vivenciar uma situação, eu imagino tudo o que é possível de acontecer ligado a ela, nos seus extremos mais criativos para, no caso de alguma realmente acontecer, eu estar preparada. Tem a ver com as polaridades que se usam no Design Estratégico - e em outras tantas áreas, ou seja, imaginar situações extremas para tirar, dali, possibilidades de inovação e construção de coisas realmente novas. Na maior parte das vezes, nunca a situação extrema que acontece. Chega a ser divertido. Quando minha filha estava para nascer, pensei tanto em tudo o que poderia acontecer, desde o percurso até o hospital, as pessoas que poderiam me levar, caso o meu marido não pudesse. E se o carro estragasse. E se tivesse um trânsito terrível. E se não desse tempo... Claro que deu tempo. Carolina ainda escolheu a tranquilidade da cidade vazia num feriado para anunciar sua chegada. Menina esperta.

Mesmo que às vezes apresente algumas camadas de sofrimento, este tipo de exercício realmente aguça a imaginação e pode, ainda que trabalhando com hipóteses, apresentar possibilidades não antes imaginadas para as nossas vidas.

No fim do ano passado falou-se muito no tal fim do mundo. Mil teorias e a imaginação das pessoas a milhão, pensando em como seria, como fariam, como enfrentar tudo isto. No meio da história, surgiram figuras pitorescas que trouxeram pimentas sutis e provocaram, assim, como quem não quer nada, alguns destes exercícios de extremo. Um deles comentou, em conversas, a possibilidade dos bancos sumirem. Tudo poderia começar com um grande bug na internet. Sem conexão, não teríamos acesso aos bancos e, sem termos acesso a eles, não teríamos como provar quanto tínhamos aplicado (ou quanto devíamos – esta é a versão positiva da brincadeira). Sem os bancos e, dali a pouco, sem dinheiro vivo nas mãos, tudo seria diferente. Muito rápido, bem dinâmico. Imaginemos, então, somente para fins de exercícios, que isto realmente possa acontecer. O que você faria?

Tem um vídeo rolando na internet há tempos de um professor que estimula os alunos a pensarem em suas verdadeiras vocações isolando a variável dinheiro da história. Digamos que o dinheiro não importasse, que suas contas estivessem pagas, o que você faria assim, genuinamente?
Eu fico imaginando a cena. Meio inspirada no filme “Ensaio sobre a cegueira”. Os homens, no seu limite, nada de dinheiro circulando e, aos poucos, as pessoas se rearticulando, como numa grande volta ao tempo das cavernas. Só que em cavernas de concreto, nas nossas cidades. Sem dinheiro para comprar nada, não teríamos tampouco gasolina para os carros e teríamos que, em pouco tempo, nos reorganizarmos em grupos, que somos, para cada um entregar o que tem de melhor. O estatístico, este cuidaria de calcular as provisões e de como utilizá-las. O articulador trataria de sair conversando com os vizinhos, em busca de permutas. E assim, sem televisão, sem internet e, justo por isto, com tempo de sobra, relembraríamos quem somos. Alguém puxaria uma roda de violão, contadores de histórias brotariam cheios de verbos e, certamente, as crianças dariam uma aula de colaboração. O exercício vale para as empresas. E se as contas estivessem pagas? Se os fornecedores que escolhêssemos nos entregassem a matéria-prima que quiséssemos, sem que tivéssemos que pagar. Se os clientes não se importassem com o preço e pudéssemos escolher, de fato, para quem gostaríamos de produzir um produto. Ou oferecer um serviço. Seriam os mesmos? Como ficaria a nossa energia da escolha, da entrega, do processo todo? Iríamos trabalhar? Ou nada mais faria sentido?
Eu não acho algo deste tipo vá acontecer. Pelo menos não, assim. Não amanhã. Mas me divirto de verdade observando meus amigos, os vizinhos, os atores corporativos, os rostos desconhecidos no supermercado e imaginando quais seriam seus novos papeis dentro de jogos divertidos de desconstrução.
E se?


* segue o link do tal vídeo que comentei, usado por um professor com seus alunos: http://www.youtube.com./watch?v=qmaq15qL7Q8